Sunday, May 13, 2018

CD: AR - Almir Sater / Renato Teixeira

10 / 10
Disco colaborativo de 2015 marca o retorno de Almir Sater e parceria com um grande medalhão da música brasileira de raíz, Renato Teixeira. E muito embora o gênero musical não seja meu favorito, Sater é um cara que mesmo eu consigo ouvir sem maiores problemas, e que encanta qualquer um que genuinamente ame música acima de qualquer rótulo musical.

Confira minha opinião!


Conversando com um amigo meu esses tempos, lembrei que eu havia negligenciado este lindíssimo trabalho de 2015. Na verdade eu não sabia muito bem se ia em frente com a ideia ou não, porque iria destoar bastante do que eu tradicionalmente falo por aqui no blog. Porém, rapidamente coloquei a mão na consciência e me peguei pensando em como que o Brasil anda carente de música. Não, não estou exagerando. Anda carente MESMO! A música brasileira foi à óbito de consciência coletiva, graças ao lento e gradual processo de deseducação e desculturação em massa que o país passou por muitos anos, até chegarmos ao momento de agora. Portanto, me senti na obrigação de falar sobre este trabalho por aqui, por mais que pudesse destoar do que eu normalmente falo.

E não me venha dizer que fanquêiros e travecos com voz de Mickey Mouse representam a música brasileira hoje; NÃO, não representam. "Aceita, que dói menos", como dizem aí nesse dito popular de hoje em dia. Não representam e nunca representarão. O que eles representam na verdade, é justamente o óbito da referida. O que eles representam, é a degradação e a vergonha de uma nação inteira que um dia teve uma produção cultural de respeito; então, já que você está aqui, chega mais pra eu te falar sobre um assunto que envolve música DE VERDADE. Ou saia porque eu ofendi o seu "idolozinho", a escolha é sua.

Enfim, o renomado compositor e músico regional Almir Sater voltou a gravar um novo disco em 2015, após uma longa ausência de 9 anos sem lançar material novo. A distância do tempo não conseguiu fazer com que o brilhante compositor, autor de clássicos como "O Tempo e o Vento" e "Um Violeiro Toca", perdesse sua magia musical. Sua música é marcada pelo som de raiz, aquela música da terceira geração de compositores sertanejos, que pessoalmente é a que eu realmente gosto de ouvir. Quem me conhece sabe muito bem que nunca fui fã de sertanejo, hoje isso ainda é bem válido, mas a maturidade dos anos acaba trazendo a este velho roqueiro que vos fala, a aura da beleza poética e instrumental de um artista genial e completo.

Só que ele não está sozinho nesta volta. Fazendo como grandes lendas da música internacional, como o grande Eric Clapton se juntando ao já saudoso J.J. Cale, Sater se junta a Renato Teixeira, outro grande medalhão da música regional, autor de "Romaria" e "Amizade Sincera", para gravar este disco lançado em dezembro de 2015, simplesmente chamado AR. O trocadilho da palavra com as iniciais de cada músico é óbvio, mas se me permitem outro trocadilho, eu direi que bons ventos trouxeram de volta esses dois, afinal de contas, todos nós sabemos o quão rarefeita, pra não dizer seca e embolorada, anda a atmosfera do cenário musical brasileiro, se é que tal cenário ainda exista nos dias de hoje.

Segundo o Felipe Martinelli, um grande amigo meu que sabe muito mais sobre essa esfera de música regional, o disco tem raízes afetivas entre os dois músicos; de acordo com ele, "esse álbum é o cumprimento de uma promessa nunca falada, mas que sempre existiu na carreira deles, de fazerem um disco juntos, já que foram parceiros de composição de grandes clássicos da música de raiz brasileira como "Tocando em Frente" e a ambos sempre tiveram uma sintonia e ligação bastante estreita e afetuosa, tanto que o irmão do Almir e a filha do Renato se casaram (e tem 2 filhas já, se não me engano)". Ou seja, este disco realmente não é obra do acaso, mas sim resultado de uma ligação afetuosa profunda, e talvez seja por isso que soe tão bem e genuíno. Valeu pela informação, Reviewtado!

Já de cara eu gosto da primeira faixa, "D de Destino", que encompassa aquela pegada bem blues que o Sater imprime nas suas músicas, sem no entanto tirar aquele sabor de sertão, de interior. A poética dos dois veteranos também é agradabilíssima, e casa perfeitamente com a melodia. "Espelho D'Água" eu gostei muito, especialmente porque me remete àquele tipo de som folk, estilo que o Eric Clapton ou o Mark Knopfler fazem. Sater e Teixeira realmente são geniais. Essas duas primeiras faixas tem Sater como a voz principal levando a melodia.

A próxima, chamada "A Primeira Vez" é uma doce e bela balada tendo Teixeira como vocal principal. A linda e cativante letra reflete sobre o passado e rememora momentos especiais. Segue mais uma baladinha chamada "A Flor Que A Gente Assopra", desta vez com Sater levando, com ares bem mais caipiras e com uma delicada melodia remontando a pureza e a simplicidade original da música caipira. Uma das coisas mais belas que você pode imaginar. Mas bela mesmo, e muito bela, é a balada "Juro"; esta doce e impecável melodia eu até mesmo parei para tirar ao violão. Toquei-a várias vezes. Não foi preciso muito tempo para entender o campo harmônico, são acordes simples, e o meu ouvido absoluto ajuda muito nesta hora, mas o difícil mesmo é reproduzi-la com a mesma doçura que o violão de Sater, que parece acalentar as cordas.

Após tanta doçura melódica, eles mandam ver uma batida rápida na excelente "Bicho Feio". Eu não sei se é porque eu já ouvi Dire Straits até entupir os tímpanos, mas imediatamente me remeteu à clássica "The Man's Too Strong", a levada rítmica é parecida; ao mesmo tempo que ela é um misto de Dire Straits, tem essa levada country blues que eu adoro, ela também remete à letra cheia de referências folclóricas de forma genial. Para mim, é uma das melhores do disco. Segue outra bela balada, "O Amor Tem Muitas Maneiras", esta com relances jazzísticos entremeados no arranjo melódico.

Segue com uma bem mais sertaneja, que na verdade é uma valsa, chamada "Peixe Frito". Na verdade não é inteiramente sertaneja, tem aquela aura, aquele arranjo vocal que remete, mas a valsa se destaca bem, e com a produção moderna, causa uma impressão de refrescância e ao mesmo tempo de nostalgia. "Amor Leva Eu" também segue nesta mesma toada, muito bonita, e se faz de ponte para vir a música que fecha o disco com categoria, a ótima "Noite dos Sinos", uma composição belíssima e inspirada sobre o Dia de Reis, com arranjos de tirar o fôlego, uma batida dançante e que até conta com uma guitarrinha de fundo, fechando a audição com chave de ouro.

Eu realmente sinto que não estou exagerando, quando digo que todo e qualquer cantor sertanejo deveria se espelhar nestes dois gênios musicais. Almir Sater retorna aqui com Renato Teixeira realmente para mostrar que não brinca em serviço, nos proporcionando momentos inesquecíveis da música de raiz com diversas influências. Eu vou mais longe: este disco, assim como o nome sugere, é um sopro de ar fresco a um mercado musical brasileiro morto atualmente e que praticamente nada tem a nos oferecer; faz muito tempo que eu não via um disco de músicos brasileiros que somasse tanto ao legado da nossa arte musical; não é só um disco para quem gosta de música caipira; é um disco para quem gosta de MÚSICA, ponto. Pura e simplesmente. E é por isso que eu finalmente o estou recomendando aqui no meu blog, retificando uma falta que eu cometi em 2015, ano de inauguração do meu blog, ao ver que eu fiz vista grossa desta maravilha musical. Portanto, deixe os violeiros tocarem, e viaje para o interior, ao som mais do que bem vindo destes dois medalhões da música brasileira. Indicação máxima!

AR (2015)
(Almir Sater / Renato Teixeira)

Tracklist:
01. D De Destino
02. Espelho D'Água
03. A Primeira Vez
04. A Flor Que A Gente Assopra
05. Juro
06. Bicho Feio
07. O Amor Tem Muitas Maneiras
08. Peixe Frito
09. Amor Leva Eu
10. Noite Dos Sinos 

Selo: Universal Music

Banda:
Almir Sater: voz, violão, viola caipira
Renato Teixeira: voz, violão
Mike Rojas: acordeão, teclados, órgão, piano
Eric Silver: violão, baixo, guitarra, mandolim, percussão, programação
Tania Hancheroff: back vocal
Vicky Hampton: back vocal
Wayne Killius: bateria, percussão

Discografia:
- + AR (2018)
- AR (2015)

Almir Sater:
- 7 Sinais (2006)

- Caminhos Me Levem (1997)

- Terra de Sonhos (1994)

- Almir Sater Ao Vivo (1992)

- Instrumental 2 (1990)

- Rasta Bonito (1989)

- Cria (1986)

- Instrumental (1985)

- Doma (1982)

- Estradeiro (1981)

Renato Teixeira:
- Amizade Sincera II (com Sérgio Reis) (2015)
- Amizade Sincera (com Sérgio Reis) (2010)
- Ao Vivo No Auditório Ibirapuera (2007)
- Renato Teixeira e Rolando Boldrin (2004)
- Cirandas, Folias e Cantigas do Povo Brasileiro (2003)
- Cantoria Brasileira (2002)
- O Novo Amanhecer (com Zé Geraldo) (2000)
- Alvorada Brasileira (com Natan Marques) (2000)
- Ao Vivo no Rio (1998)
- Um Poeta e Um Violão (1997)
- Sonhos Guaranis (1996)
- Aguaraterra (com Xangai) (1995)
- Ao Vivo em Tatuí (com Pena Branca & Xavantinho) (1992)
- Amizade Sincera (1990)
- Renato Teixeira (1986)
- Terra Tão Querida (1985)
- Azul (1984)
- Um Brasileiro Errante (1982)
- Uma Doce Canção (1981)
- Garapa (1980)
- Amora (1979)
- Romaria (1977)
- Paisagem (1973)
- Álbum de Família (1971)
- Maranhão e Renato Teixeira (1969)









Sites Oficiais: www.almirsater.net / www.renatoteixeira.com.br

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